quinta-feira, 14 de abril de 2011

A vivacidade de Filipa

Havia convites a mais quando me lembrei "será que ela aceita?" Na dúvida tenta-se sempre, pensei. No caminho para o estúdio aparece T, e pergunto-lhe o que acha. 
-  Acho uma óptima ideia, muitíssimo boa, aliás, mas será que ela não se deita cedo?
- Achas? No jantar de Natal não queria ir para casa...
Estávamos as duas na dúvida quando surge ela a fumar o seu cigarro. Vou ter com ela e pergunto.
- O que é que vai fazer hoje à noite?
- Eu, filha? Nada! Que havia eu de fazer numa 3ª feira à noite de especial?...
- Então já tem programa! Que me diz a ir ao salão preto e prata no Casino do Estoril, onde vai ser a Gala da TV 7 Dias, porque o programa está nomeado para duas categorias?
- Digo que sim, claro! Só tens que me ir buscar a casa, pode ser?
- Sem problema nenhum!
Combinamos horas, e mando uma mensagem a M., meu companheiro de secretária, que também ia ser companheiro de mesa "a Filipa Vacondeus vai!" A resposta, bem humorada, que não se fez tardar foi "maravilhoso, assim já não sou o mais velho da mesa!" (risos)
Às 19h30 lá estava, pontualmente, em Campo de Ourique pronta para a ir buscar e ela, claro, já estava pronta para sair. E garanto-vos que não podia ter tido ideia melhor, além de boa companhia, tinha ao meu lado um poço de sabedoria na arte de bem viver. No caminho, conta-me que esteve noiva do filho do Fausto Figueiredo.
- Sabe quem era?
- Não.
- Pois, você é muito nova... Era a família que tinha o Casino do Estoril antes de passar para o Stanley Ho. Foi o Fausto Figueiredo que construiu o Hotel Palácio, os jardins em frente ao Casino e a rede dos comboios, e claro era o dono do casino. Eram a fina flor e eu estava noiva do filho dele.
- E o que aconteceu para não se casarem?
- Ó minha rica filha, estava tudo pronto, prendas maravilhosas, casa montada, vestido feito, convites confirmados e eu, uma semana antes, desisti de tudo.
- Que se passou?
- Passou-se que ele andava enamorado por uma bailarina francesa do casino, e devia pensar que eu não sabia... Uma semana antes do casamento tinhamos hora marcada com o padre às 9h da manhã. E eu disse-lhe: amanhã é bom que apareças às 9h em ponto, porque se apareceres  às 9h05 já não me encontras lá e sabes bem porquê!
- E?
- E ele pensou que eu estava a fazer bluff! Ele não apareceu às 9h e eu, tal como disse, às 9h05 não estava lá. Eu sabia muito bem a que é que se devia o atraso, e não estava para aquilo.
-Mas o que fez?
- Escrevi uma carta estilo Churchill á mãe dele, a dizer que se encarrega-se ela dele, que eu tinha desistido, e pirei-me para Madrid onde fiquei um mês! Nem imagina o reboliço que foi na imprensa naquela altura, uma verdadeira loucura! A minha mãe andava doida. (risos)
- Alguma vez se arrependeu?
- Nunca! Foi a melhor coisa que fiz na vida, nunca tive um pingo de arrependimento. Hoje seria uma tia execrável, daquelas horrorosas de aturar, que estaria numa mansão na Suiça, a fazer tricot! Deus me livre! 

Filipa Vacondeus é assim, sem papas na língua, vivaça, espontanêa, cheia de piada e sobretudo uma jovem com 78 anos! O tempo passa a correr, ao lado dela, sempre com milhares  de histórias deliciosas de ouvir. No casino, onde estava toda a gente do meio (do entretenimento à informação passando pelas telenovelas) e  de todos os canais, assistimos a um espectáculo melhor do que sinceramente previa. 
Herman José deu corpo a uma  Angela Merkel cheia de piada,  João Baião a um Cristiano Ronaldo de chorar a rir, Maria Vieira encarnou um Cisne Negro, e até parecia mais magra. E os prémios tiveram discursos bem divertidos. Teresa Guilherme brincou com o facto de ganhar um prémio com um programa da SIC, canal onde há muito não está, o que dá para ver quanto tempo alguns projectos televisivos ficam na gaveta. José Alberto Carvalho ganhou um prémio pela RTP, mas aproveitou para dizer que estava empenhado em fazer um bom trabalho na TVI, e por ai em diante. Comoveu-me, em particular, o prémio entregue às netas de Mariana Rey Monteiro. Uma delas no discurso contou que uma colega do 3º ano do conservatório, não fazia ideia quem era a sua avó. No entanto foi alguém que deu tudo á representação. A cultura é para todos, mas nem todos fazem uso dela, mesmo quem tem hipóteses, e isso é  que é realmente triste.

Mas a bem dizer, a gala começou com um enorme atraso, à boa maneira portuguesa pois está claro, por isso terminou também muito mais tarde que o previsto. Eram 2h30 da manhã, já eu abria, vezes sem conta, a boca discretamente. Virei-me para a Filipa e disse:
- Vamos embora, certo?
- Por mim ainda podíamos ir à ceia, que me diz? (Á ceia?!! Pensei eu já a arrastar-me) Sabes é que já passaram tantas horas que estou com imensa fome.
M. acompanhou-nos e graças a Deus, parece que tinha dado fome a muita gente, pela fila longa que estava. Foi então que Filipa deu de si.
- Minha querida, era só o que faltava estar nesta fila toda para comer dois croquetes. Que pindéricos! Isto não é para nós, pois não?
- Não mesmo, digo eu! Vamos então. (Ufas...)
Deixei-a em casa às 3h da manhã, e a caminho da minha, dei por mim a pensar - alguém acredita que até meio do dia apetecia-me tudo, menos ir dar o ar da minha graça seja para que gala fosse. É que não me apetecia nadica de nada. E alguém acredita que nem ao cabeleiro fui?! 

Já tinha dito, mas volto a dizer: às vezes acontecem coisas maravilhosas quando decidimos sair de casa. Há sempre conversas novas à espera, e pequenos gestos que fazem grandes diferenças. Uma noite que, com certeza, mais tarde vou recordar.

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